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DESTAQUES
• MP investiga empresa de esposa de secretário
• Governo estuda novo critério para avaliar zika
• Fernando Machado nega que tenha envolvimento com SOS Samu
• "Se o Credeq tivesse ficado pronto antes, não teríamos o grau de excelência que temos agora"
• Múltipla assistência
• Reparação da mama ainda demora no SUS
TV GLOBO/ FANTÁSTICO
Funcionários do Samu são acusados de levar pacientes a CTIs por propina
Há suspeitas de que algumas pessoas tiveram quadro de saúde piorado só para serem internadas em centros de terapia intensiva, em Goiás.
Um escandâlo na saúde pública brasileira. Em Goiás, médicos, enfermeiros e motoristas do Samu, o serviço público de atendimento a emergências, são acusados de levar pacientes para CTIs particulares em troca de propina. E o mais grave: há suspeitas de que algumas pessoas tiveram o quadro de saúde piorado só para serem internadas em uma unidade de terapia intensiva.
A mulher do secretário de saúde de Goiânia é sócia de uma empresa que gerencia CTIs. Essa empresa também está sendo investigada pelo Ministério Público. Veja na reportagem do Fantástico.
O POPULAR
MP investiga empresa de esposa de secretário
S.O.S. SAMU Médica é sócia da Oati, que tem faturista citado em propinas
A esposa do secretário de Saúde de Goiânia, Fernando Machado, é sócia de uma das empresas investigadas pelo Ministério Público de Goiás (MP-GO) na Operação S.O.S. Samu, deflagrada no dia 21 de junho. O nome da médica Vanessa Gomes Maciel está entre os cotistas da Organização Aparecídense de Terapia Intensiva Ltda. (Oati), localizada em Aparecida de Goiânia. A Oati é uma das 18 empresas que foram alvos de mandados de busca e apreensão.
A operação do MP apura suposto esquema de pagamento de propina a servidores do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) de Goiânia, em decorrência do encaminhamento irregular de pacientes de planos de saúde para UTIs de hospitais privados.
Inicialmente, foi Fernando Machado quem investiu na aquisição da Oati, chegando a ser sócio da empresa entre 2012 e 2014. No dia 17 de novembro de 2014, ele passou as cotas para o nome da esposa. O secretário explica que fez isso porque, apesar de não ser o gestor ou administrador da empresa, estava sem tempo para acompanhar os negócios. "Tive de canalizar 100% do meu tempo na secretaria. A partir disso, passei a não acompanhar mais de forma alguma", afirma. A tarefa está, desde então, sob a responsabilidade de Vanessa, que é, inclusive, quem consta como administradora dos demais negócios da família.
A sede da Oati fica dentro do Hospital Encore, na Vila Brasília, em Aparecida. Os demais sócios da empresa são: Guilherme de Oliveira Barbosa, Marcus Tadeu Gianotti de Araújo Piantino, Sebastião Siqueira de Carvalho Júnior e a Sagh (Soluções Administrativas em Gestão I Tospitalar Eireli – ME) na pessoa de Yuri Vasconcelos Pinheiro. O faturista que prestava serviços à Oati, Edison da Conceição Filgueiras Júnior, chegou a ser preso na operação do MP, suspeito de pagamento de vantagem indevida a socorristas do Samu. "Fora o faturista, ninguém ali está sen -do investigado", frisa Fernando Machado.
O secretário e a esposa possuem outras duas empresas que se enquadram no perfil de investimentos e participações: a FMVM Participações Ltda. e a Brigadeiro Participações e Investimentos Ltda. Juntas, elas equivalem, segundo o Quadro de Sócios e Administradores (QSA) do site da Receita Federal, a um capital social de mais de R$ 2,6 milhões.
Menções em interrogatórios
O nome de Fernando Machado é citado em interrogatórios feitos pela investigação da Operação S.O.S. Samu. Em um deles, no dia 25 de fevereiro deste ano, o interrogando, socorristado Samu desde 2008, diz que Machado e o médico Rodrigo Cleto, um dos que foram presos no dia 21 de junho, possuem participações em UTIs de Goiânia. Em um segundo, no dia da operação, outro socorrista voltou a lembrar o fato, dizendo acreditar na sociedade de ambos.
Cleto é um dos médicos que mais aparecem na investigação feita pelo Ministério Público. O nome dele consta entre os sócios de cinco das empresas investigadas. Em nenhuma delas, conforme levantamento feito pelo POPULAR, aparece o nome de Fernando Machado.
18 empresas de Goiânia, Anápolis e Aparecida foram alvos de mandados de busca e apreensão e são investigadas pelo MP
Não há nada que a gente tenha feito de Ilegal ou imoral"
Secretário municipal de Saúde explica atuação da esposa na empresa de UTIs investigada na Operação S.O.S. Samu e diz que desconhecia suposto esquema de propina no período em que foi sócio da mesma empresa.
A sua esposa assumiu as cotas que estavam no seu nome. Ela trabalha na Oati? Frequenta a empresa?
Ela não gerencia a empresa. É cotista, apenas. Eu talei que passaria as cotas para ela para ver se ela poderia acompanhar melhor do que eu. Eu não conseguiria acompanhar nada. e a gente tem de saber da saúde financeira da empresa. A princípio, não há nada que a gente tenha feito de ilegal ou imoral. Foi tudo dentro da legalidade.
Nas duas empresas de investimentos da família, a FMVM e a Brigadeiro, os sócios são o senhor e sua esposa. Por que a existência de duas empresas patrimoniais, já que os sócios são os mesmos?
Isso foi uma orientação do contador. Tem que olhar a parte técnica contábil. A gente pensou há algum tempo atrás na questão sucessória. Na ausência minha ou da esposa, essa questão sucessória, de espólio, seria complicada.
O senhor foi sócio da Oati até 2014 e as investigações do MP abordam este período, antes e depois. Na época, o senhor não tinha conhecimento do esquema?
Não. Esse esquema foi desbaratado uma vez e, na verdade, agente não pode nem prejulgar, porque parece que isso nem foi a júri ainda. Foi em 2008. Falar que nunca ouvi não tem jeito, porque em 2008 teve a ação. Agora, que o pessoal continuou depois de 2008, isso nem passava pela cabeça da gente.
Esse esquema de pagamentos para servidores do Samu não é segredo entre diretores de hospitais. Todos sabem.
Mas eu não sou diretor de hospital.
Mas o senhor, enquanto sócio de uma empresa de UTI, como a Oati, não sabia que isso existia?
Não. Aparecida tem poucos hospitais. Esse hospital, especificamente, é um hospital de grande excelência, tem uma demanda normal, pronto-socorro aberto, é especializado em cardiologia. O que teve na Oati foi o seguinte: o faturista da empresa está na operação. Foi feita uma busca e apreensão, a empresa está sendo investigada, mas a única pessoa que está sob investigação é o faturista. Ele também faz fatura para outros lugares. A gente não sabe, então, se houve algum problema em relação à Oati ou em relação a outra empresa. Pontualmente, é um funcionário registrado, que tem carteira assinada e que, inclusive, recebe um porcentual do faturamento que ele faz.
O senhor acredita que ele pode ter integrado o esquema para aumentar essa comissão?
É difícil falar isso. Eu estaria cometendo, talvez, uma injustiça. Os fatos precisam ser melhor apurados e julgados. Não tem como afirmar. Tudo é possível. Os dados que eu tenho é que o faturista realmente está envolvido na operação (S.O.S. Samu).
"Se tivessem algum indício, alguma prova, alguma coisa, eles não iriam poupar um secretário, que é um agente publico
Brigas por causa de pacientes
"Não coloque mais as mãos em meus pacientes", teria dito Edison da Conceição Júnior durante discussão com um servidor do Samu, após não ter a ordem de encaminhamento irregular cumprida pela equipe de socorro. O fato é narrado em um dos interrogatórios da Operação S.O.S. Samu. Edison é citado como aquele que realizava o pagamento das propinas pelo envio de pacientes para UTIs dos hospitais Encore, Clinicado Esporte, Acidentados, Jabob Facuri e antiga Fêmina.
Segundo relato do investigado, o escritório de Edison funcionava dentro do Hospital Encore, em Aparecida de Goiânia, o mesmo onde fica a UTI da Organização Aparecidense de Terapia Intensiva Ltda. (Oati), empresa que tem como sócia a esposa do secretário Fernando Machado. Nos depoimentos, consta ainda a afirmação de que médicos reguladores e Edison ameaçavam socorristas, caso eles discordassem do esquema, dizendo que podiam perder gratificações ou voltariam aos órgãos de origem. Os interrogatórios evidenciam a recorrência de discussões entre enfermeiros e reguladores, quando eles não queriam seguir as ordens de encaminhamento de pacientes. (03/07/16)
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Governo estuda novo critério para avaliar zika
O Ministério da Saúde avalia novas mudanças nos critérios para identificar os casos de microcefalia e outros efeitos do vírus da zika em recém-nascidos. Agora, possíveis danos neurológicos serão incluídos como critérios de triagem de bebês, mesmo que não haja suspeita de microcefalia A alteração ocorre após um estudo mostrar que um em cada cinco bebês com infecção provável" ou confirmada pelo vírus da zika e com danos neurológicos não tinham microcefalia. (03/07/16)
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JORNAL OPÇÃO
Fernando Machado nega que tenha envolvimento com SOS Samu
Por Augusto Diniz
Em nota, o secretário municipal de Saúde de Goiânia informou na tarde deste domingo (3/7) que não participa de qualquer suposto esquema irregular investigado pelo MP-GO
Depois de o Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO), por meio do Grupo de Atuação Especial de Combate a Crime Organizado (Gaeco), deflagar no dia 21 de junho a operação SOS Samu, que investiga pagamento de propina para encaminhar pacientes do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) para Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) da rede particular, o secretário municipal de Saúde, Fernando Machado, negou na tarde deste domingo (3/7) qualquer envolvimento dele e da esposa, a médica Vanessa Gomes Maciel, no esquema que está em fase de apuração pelo MP.
Em nota, Fernando Machado afirmou que não tem “nenhum envolvimento com as supostas irregularidades investigadas pelo Ministério Público do Estado de Goiás” na Operação SOS Samu. “Esclarece ainda que o fato de sua esposa ter cotas em uma empresa de UTI (Organização Aparecidense de Terapia Intensiva LTDA – Oati) em outro município não configura participação dos mesmos em qualquer ilícito.”
Fernando Machado já havia negado envolvimento no esquema investigado em entrevista concedida ao Jornal Opção na semana passada.
Leia abaixo a nota completa:
O secretário municipal de Saúde de Goiânia, Fernando Machado, reafirma que não tem nenhum envolvimento com as supostas irregularidades investigadas pelo Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO), no âmbito da Operação SOS Samu.
Esclarece ainda que o fato de sua esposa ter cotas em uma empresa de UTI em outro município (Aparecida de Goiânia) não configura participação dos mesmos em qualquer ilícito. A família adquiriu cotas na empresa em período anterior à gestão de Fernando Machado como secretário.
Espera-se que o funcionário da empresa que está sendo investigado esclareça as acusações contra ele. O secretário explica que é de praxe, e natural, o acompanhamento da situação administrativa da empresa tanto pela cotista, quanto por seu cônjuge. A empresa não possui vínculo com o SUS.
Em matéria divulgada no site do próprio MP-GO, está clara a colaboração do secretário, que se dispôs prontamente a fornecer documentos que auxiliem na apuração dos fatos e a prestar esclarecimentos, se necessário. Fernando Machado não foi convidado a depor no MP, pois não há, no inquérito da investigação, indício ou prova que justifiquem tal ato.
Fernando Machado – Secretário municipal de Saúde (03/07/16)
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"Se o Credeq tivesse ficado pronto antes, não teríamos o grau de excelência que temos agora"
Diretor técnico da nova unidade detalha como é o funcionamento do primeiro Centro de Referência e Excelência em Dependência Química de Goiás
As drogas são um problema para muitos países. No Brasil, quando se trata do assunto, é comum ver análises relacionadas sempre à segurança pública, ao tráfico e às mortes causadas pelo combate policial. De fato, esse tipo de análise é inevitável, afinal as leis brasileiras proíbem o comércio de drogas entorpecentes – à exceção de álcool e tabaco.
Porém, a questão é mais ampla. Nos últimos anos, as drogas têm estado de maneira recorrente nos debates de saúde pública, visto que o número de dependentes químicos cresce a cada ano e, sem uma solução pública eficaz para o tratamento, a sociedade brasileira viu surgir, ao longo do tempo, diversas iniciativas, sobretudo de comunidades religiosas, para cuidar da recuperação dessas pessoas.
Contudo, muitas vezes, tais iniciativas não contam com a estrutura física ou com os profissionais necessários para que os indivíduos se recuperem completamente, embora prestem um trabalho importante no sentido de amenizar esse problema, que é também social. E a falta de estrutura não é um privilégio apenas de iniciativas da sociedade, pois também não é encontrada com facilidade no serviço público.
Foi visando dar uma resposta a isso que o governo de Goiás anunciou, ainda em 2012, que iria construir a primeira unidade do Centro de Referência e Excelência em Dependência Química (Credeq). As obras começaram em 2013 e, após quase três anos, o Credeq Professor Jamil Issy foi inaugurado no fim do mês de junho – recebeu os dois primeiros pacientes no início da semana passada. Por que demorou tanto para que a unidade entrasse em funcionamento?
"Realmente foram três anos, mas é importante lembrar que essa é uma unidade nova. Um hospital, obra para a qual já existe um modelo e a empresa contratada apenas vai lá e executa, fica pronto em no máximo um ano. Agora, uma obra do tamanho do Credeq, e com a especificidade que ele tem, é mais difícil. Durante esse período, o próprio projeto foi repensado, melhorado. Se essa construção tivesse ficado pronta muito antes, talvez não tivéssemos o grau de excelência que temos agora."
A resposta é do diretor técnico do Credeq, Thiago Batista de Oliveira, que concedeu entrevista ao Jornal Opção na sede da unidade, em Aparecida de Goiânia. Ele explica que o Credeq, que será gerenciado pela organização social Luz da Vida, vem para complementar a rede prestadora de serviços. "O Credeq, com seus 96 leitos altamente especializados, vai auxiliar a rede inteira atendendo apenas os casos mais graves. São poucos os leitos? Quando entendemos que o Credeq foi desenhado para atender aos casos de internação mais graves, sabemos que ele não vai atender todo problema de dependência química; vai atender uma parcela muito específica, então não é pouco", diz.
Qual a estrutura do Credeq e o que vai funcionar de fato?
O Credeq é uma unidade desenhada para o tratamento dos casos mais graves de dependência química, aqueles casos que necessitam de internação. Contemplamos assistência em nível de internação e também assistência em nível ambulatorial.
Temos 96 leitos de internação, que são de dois tipos. São 12 leitos de desintoxicação, em que fazemos tratamento dos casos de pacientes intoxicados por substâncias com sintomas de abstinência significativa e que precisam de assistência de médico e de equipe de enfermagem. O tratamento nesses 12 leitos dura, em média, sete dias.
Os outros 84 leitos são para tratamentos mais prolongados, de reabilitação, que duram em média 90 dias. Esse tratamento tem perfil um pouco diferente, pois é desenhado para unidades com perfil residencial, bem semelhante a uma casa. Cada uma das casas no Credeq tem 12 vagas. A pessoa "mora" lá e recebe suporte presencial de técnico de enfermagem durante 24 horas por dia. Fora isso, a unidade tem plantonistas médico e enfermeiro 24 horas para quaisquer intercorrências.
Durante o dia são feitas atividades terapêuticas multiprofissionais, com atendimento de psicólogo, individual, de grupos e familiares também. Tem assistente social, terapeuta ocupacional, preparador físico e musicoterapeuta, que é uma atividade nova nesse projeto e que também vai integrar o corpo técnico utilizando como ferramenta a musicoterapia.
Além dessas internações, temos o suporte de ambulatório, para pacientes que não precisam mais de internação e recebem alta e também para aqueles casos que, desde o início, nós identificamos que não precisam de internação. Esses casos, geralmente, são porque o município encaminha o paciente por não ter estrutura, em outras unidades da rede, para fazer o acompanhamento. Então, nós damos assistência no nosso ambulatório.
O Credeq conta com três núcleos: de adultos, acima de 18 anos; de adolescentes, entre 12 e 18 anos; e o infantil. Abriremos inicialmente o núcleo de adultos, com 6 vagas para desintoxicação e 24 vagas de internação residencial. Começamos com esses leitos e gradativamente vamos ampliando, com a abertura de vagas nos outros núcleos, abrindo o infantil numa última etapa. No início, ainda não temos o ambulatório funcionando, mas já começamos com as internações.
Os três núcleos são separados?
Sim. Apenas a área de lazer, que fica no centro da estrutura, é comum aos três núcleos. Essa área tem quadra poliesportiva, duas piscinas (uma adulto e uma infantil), e uma quadra society. Os núcleos não têm acesso direto entre eles, de forma que não há contato entre adultos e adolescentes e o público infantil.
Esse trabalho de recuperação de dependentes químicos é, geralmente, feito por entidades religiosas, que mantêm casas de recuperação. O poder público também disponibiliza um serviço nesse sentido, mas as vagas para internação são poucas. O Credeq vem para atender esse aspecto, sendo uma proposta inovadora. Em Portugal, algo parecido funcionou. Qual é a expectativa?
O Credeq não foi desenhado para substituir a atuação dessas unidades da sociedade civil. Na verdade, ele foi desenhado para suprir uma necessidade da rede de saúde pública atual. A rede em atenção a álcool e drogas, em que pese existir algumas estruturas em atenção básica – Caps [Centro de Atenção Psicossocial], Caps-AD [Álcool e Drogas] – não dá suporte para casos de dependência que necessitam de internação. Há um suporte para internação psiquiátrica quando o paciente está muito alterado por efeito de substancias, ou internação clínica de desintoxicação em hospital geral. Mas o governo percebeu que isso não era suficiente para a assistência ao dependente químico. Por causa disso, por não ter na rede pública de saúde unidades que prestassem assistência nesses casos mais graves que necessitam de internação, a sociedade acaba tendo de recorrer e se organizar a esse respeito.
Daí surgiram as comunidades terapêuticas, casas de recuperação que prestam esse tratamento de internação, muitas vezes mais de cunho voluntário, sem muito suporte técnico, o que resulta numa assistência nem sempre adequada. Na verdade, Goiás não tem isso muito bem estruturado, mas em São Paulo e Rio de Janeiro. Quem pode pagar, em São Paulo, no Rio e até fora do país, tem tratamento de internação de alta qualidade. Já as famílias que só têm acesso ao serviço público acabam não tendo acesso a esse tipo de tratamento para os casos mais graves.
O Estado percebeu isso e construiu uma unidade nesse sentido, para integrar uma rede que já existe. O Credeq não é uma unidade que se propõe a atender isoladamente todos os casos de dependência química. Não é essa a intenção, até porque seria uma unidade muito pequena para o Estado inteiro. Mas, se conseguirmos visualizar que da mesma forma que os casos mais graves em um hospital são tratados em leitos de UTI, normalmente em número de 12 a 30 para o hospital inteiro, o Credeq com seus 96 leitos para a rede inteira vai atender apenas os casos mais graves. A UTI não precisa de um número muito grande de leitos para atender um hospital, mas demanda leitos altamente especializados para lidar com os casos mais graves. O Credeq também é assim.
O Credeq conta com três núcleos: de adultos, acima de 18 anos; de adolescentes, entre 12 e 18 anos; e o infantil. inicialmente vai funcionar o núcleo de adultos, com 6 vagas para desintoxicação e 24 vagas de internação residencial" | Foto: Renan Accioly / Jornal Opção
Especificamente, quais são as características de um caso grave?
Quem vai fazer essa referência são as unidades de saúde, os Caps, que têm as condições para avaliar isso. De maneira geral, é aquele caso em que o indivíduo não consegue, pela gravidade da dependência química, aderir a um tratamento ambulatorial, um tratamento aberto. Talvez esse paciente até vá para uma avaliação, mas ele não consegue voltar por estar em uso contínuo da substância. Esse paciente já não tem vínculo de trabalho ou esse vínculo é precário, já rompeu o vínculo família e tem dificuldades grandes em relação ao autocuidado. Esses são elementos de gravidade das dependências; notando que nem todo mundo que usa essas substâncias apresenta dependência e nem toda dependência é grave. Alguns dependentes mantêm o trabalho, os estudos e a estrutura familiar, ainda que tenham prejuízos, mas eles conseguem manejar esse prejuízo. Casos assim não precisam de internação, pois isso faria com que eles rompessem os vínculos familiares e de trabalho, o que seria mais prejudicial.
Tudo isso é avaliado pela equipe, não só quanto à gravidade do caso, mas quanto à proposta dela e aos recursos disponíveis para atender aquele caso. Exemplo: o município de Aparecida de Goiânia tem um Caps-AD, que funciona 24 horas com recursos maiores para prestar assistência. Então, se essa unidade tem condições de prestar assistência nesse equipamento e isso é efetivo para o paciente, realmente não há necessidade de internação. Mas se para aquele paciente não há recursos na unidade, então realmente tem de ser feita a internação.
E como é o processo de desintoxicação? É um processo medicamentoso?
Do ponto de vista médico, chamamos de desintoxicação o período necessário para o organismo se livrar daquela substância. É um processo natural e o que os medicamentos fazem é dar um suporte. Não há como acelerar a metabolização, fazer mais rápido esse processo. Na verdade há um prazo para o organismo se livrar, e esse prazo é de acordo com a substância; algumas levam mais tempo para metabolizar, com outras isso ocorre mais rapidamente.
Dentro desse contexto, à medida que o organismo elimina a substância, sem que a pessoa volte a ingeri-la, se ela já desenvolveu um quadro de dependência, é muito comum que passe a apresentar sintomas de abstinência. Na verdade, a abstinência é um marcador da dependência. Esse indivíduo, a partir do momento em que não faz mais uso da droga, portanto, passa a apresentar esses sintomas, que são aquilo que traz mais complicações do ponto de vista clínico. Curiosamente, de todas as substâncias em uso a que traz mais preocupação em relação a isso é o álcool – apesar de as pessoas focarem muito na cocaína e no crack. No caso destas, não há sintomas clínicos de abstinência muito graves. Já com o álcool, se a dependência é pesada e o paciente está debilitado fisicamente, ele pode sentir isso e até ir a óbito.
Ou seja, durante esse período de desintoxicação, em que o organismo vai eliminando essa substância, é preciso tratar ativamente essa abstinência, para evitar que ela se complique e piore o quadro, levando, por exemplo, a um evento grave chamado "delirium tremens", o que demandará, como manejo, até mesmo uma unidade de terapia intensiva. O leito de desintoxicação é voltado para o controle desse período, quando o indivíduo está sob o efeito de uma grande quantidade de uma substância no organismo.
O tratamento no Credeq extrapola a parte médica propriamente dita e abrange outras questões. Como é esse processo?
Na verdade, o tratamento que damos é ampliado, não visualiza apenas a questão biológica. O entendimento que temos sobre o ser humano é mais completo, que necessita de outras especialidades médicas, como o psiquiatra, por exemplo. A pessoa pode ter outros transtornos mentais associados à droga, que precisam ser abordados e tratados. No aspecto psicológico, pesa a maneira com que o indivíduo se relaciona com o mundo e consigo mesmo, a maneira com que lida com o fato de ter uma doença, uma dependência.
Outro fator que precisamos considerar – e que observamos com muita intensidade na mídia – é o aspecto social. O ser humano é um ser social, independentemente de ter um núcleo familiar. Ele tem vínculos de amizade, de relacionamento conjugal, de trabalho e isso pode tanto proteger o indivíduo do uso de drogas – como aquele que pratica um esporte, por exemplo – ou favorecer seu envolvimento com isso.
Nesse sentido, o Credeq é um avanço, porque na rede pública não há uma unidade de saúde que trabalhe com o aspecto espiritual. A rede trabalha com o aspecto psicossocial, de que a gente ouve falar muito, mas não há um suporte muito intenso na questão de assistência biológica e não há nada em relação ao aspecto espiritual. O Credeq inova ao conseguir englobar todos esses aspectos.
Em relação à parte espiritual, a OS que gere o Credeq é ligada à Igreja Católica. É nesse sentido que o sr. fala?
Sim, a Comunidade Luz da Vida é uma comunidade de leigos, não de alguma ordem religiosa, mas que está ligada à Igreja Católica. Porém, entendemos espiritualidade em um conceito bem mais amplo, que não implica necessariamente ter uma religião específica. O trabalho consiste em entender que há um sentido para a vida e valores que as pessoas prezam, e que isso é importante para elas e é preciso respeitar. As religiões trabalham esses conceitos de espiritualidade, no sentido de ter questões como princípios muito caros. Por exemplo, para determinadas religiões, há princípios como família, honestidade, justiça, compaixão. Nesse sentido é que trabalharemos a questão da espiritualidade e não no sentido de trabalhar qualquer religião de forma específica.
Mas haverá capelas no Credeq, certo?
Sim. Dentro do Credeq tem três capelas, de acordo com as religiões mais representativas: uma voltada à Igreja Católica; outra, aos evangélicos; e uma terceira, à comunidade espírita. Ainda que existam esses espaços e estejamos desenvolvendo parcerias para que as comunidades religiosas os ocupem, definindo seu trabalho de cultos e ritos, o aspecto de espiritualidade é tratado durante todo o desenvolvimento terapêutico, não só nesses momentos específicos ou de acordo com alguma religião em particular.
"Combater drogas pelo acesso não é o mais adequado"
Atualmente, fala-se muito de ressocialização, algo que não se vê nos presídios e que é um importante passo para solucionar muitos problemas. Quando se trata de dependência química, esse também é um ponto essencial. Qual será o papel do Credeq nesse sentido?
Nosso projeto terapêutico já vislumbra isso, pois, durante o tratamento, são realizadas ações voltadas a essa ressocialização do indivíduo. São questões relativas ao profissional de assistência social, que é quem faz a construção de vínculos sociais e de relações de trabalho, o que o mantem bem. A partir do momento que ele tem essas relações, que desenvolve a vida, ela também tem uma "espiritual", ligada ao aspecto do sentido de vida da qual já falamos. Ele passa a ter um sentido de vida, pois a droga tira isso dele. É interessante que as pessoas não usem drogas porque não é preciso, e não apenas por não ter acesso. Pois, quanto ao acesso, a pessoa acaba arranjando meios de consegui-la, então combater as drogas pelo acesso não é a forma mais adequada – não para adultos, para pessoas com um desenvolvimento cognitivo completo, pois ela simplesmente vai atrás. A melhor estratégia é trabalhar a rede social, o espírito de vida, que é o que de fato protege a pessoa. Isso está ligado ao que falei, que é quando a droga passa a não ter mais significado. "Para quê usar uma substância que altera meu estado de consciência?" Melhor viver a realidade, que é mais atraente que uma ilusão, uma alteração dessa realidade – esta é a perspectiva de reconstrução no projeto e, nessa ressocialização, que chamamos de reabilitação ou habilitação, uma vez que trabalhamos com crianças e adolescentes. Você precisa treiná-los para viver em sociedade, pois eles não viviam e se degeneraram. Todo o processo visa reintegrar o indivíduo à sociedade.
Na área do Credeq terá espaços para horta e até animais de estimação. Como será isso?
Cada uma das casas terá um espaço para horta. Esse cultivo servirá tanto para o lado terapêutico quanto para o fato de desenvolver uma capacitação para a pessoa cultivar em casa aquilo para seu próprio consumo, aprendendo a fazer isso em um terreno pequeno; não é preciso ter uma área grande. Durante o processo terapêutico, isso fortalece alguns indivíduos, que podem levar isso à frente como uma atividade profissional ou ocupacional.
Há também um canil, porque entendemos que isso ajuda na construção de um vínculo afetivo. Especialmente o cão, porque é o animal que melhor faz o desenvolvimento desse vínculo, é o ser, entre todos, que exige menos e dá muito mais do que recebe. Isso é algo que facilita para a pessoa que tem dificuldade em construir vínculos, porque muitas vezes ela não consegue manter relacionamento com pessoas próximas a ela; como o cachorro tem um grau de exigência muito menor, essa construção fica facilitada. Isso, por sua vez, ajuda o indivíduo em recuperação a ativar sua capacidade de estabelecer esses vínculos. Por entendermos a importância desse vínculo afetivo é que foi pensada essa estratégia com animais.
E como será a presença desses animais? Eles vêm com os próprios pacientes?
Pelo desenho que traçamos, a própria OS vai trazer esses animais, à medida que as casas forem ocupadas, para que os pacientes cuidem. Será um animal por casa e não por pessoa, até porque haveria muita dificuldade para manejar se fosse individual, por conta do próprio animal, que se adapta ao ambiente. Como haverá uma rotatividade alta de pacientes, é melhor que os bichos pertençam à casa, àquele espaço, que passa a ser seu território.
Nas casas, vai haver diferenciação de gênero?
Em relação às casas, sim. Vamos ter casas só de homens ou só de mulheres. Mas vamos atender aos dois gêneros.
E com que tipo de droga o Credeq vai trabalhar?
Com todos. Não temos nenhuma restrição. As restrições são em relação à gravidade da dependência e não de qual tipo ela seja.
Como vai funcionar a regulação? Os pacientes serão enviados pelo sistema de saúde?
A regulação estadual abriu encaminhamento, neste primeiro momento, aos Caps-AD, para esses primeiros 30 leitos, porque essas unidades têm como determinar melhor quais são os casos mais graves. Os Caps-AD têm essa condição de avaliar. Eles vão fazer a solicitação de encaminhamento para o sistema de regulação do Estado, que vai definir quais pacientes virão. O Credeq oferece uma agenda de avaliações da equipe multiprofissional. Ao longo do dia, são feitas em torno de oito avaliações iniciais. É uma avaliação bastante extensa, pois envolve desde o primeiro contato, em que o enfermeiro faz a classificação de risco para ver se é necessária a intervenção médica naquele momento; não acontecendo, o restante da equipe faz a avaliação psicológica, social e médica. Essa equipe define se aquele caso é necessariamente de internação ou se é possível de ser ambulatorial. Decidindo pela internação, o Credeq o faz de acordo com o perfil do paciente: se precisa de desintoxicação ou se pode ir direto para o leito de reabilitação.
Então, o paciente precisa passar pelos Caps para chegar ao Credeq.
Necessariamente. O Credeq é bastante insuficiente para avaliar a situação de todas as pessoas que precisam de internação no Estado. Isso deve partir de uma rede já existente, pois ela tem condições de absorver um número muito maior de pessoas, atendendo aqueles que a rede tem competência para atender e encaminhar apenas os casos mais graves para nós. A maioria dos casos de dependência de química não precisam de internação, mas o que precisam demandam um espaço específico. Para isso o Credeq.
Por que o Credeq demorou tanto para entrar em funcionamento?
Realmente foram três anos, mas é importante lembrar que essa é uma unidade nova. Um hospital, obra para a qual já existe um modelo e a empresa contratada apenas vai lá e executa, fica pronto em no máximo um ano. Agora, uma obra do tamanho do Credeq, e com a especificidade que ele tem, é mais difícil. Durante esse processo, algumas dificuldades foram sendo identificadas e precisavam ser sanadas. Mas encaro esse tempo como uma oportunidade que a Secretaria Estadual de Saúde teve, inclusive, para repensar e redesenhar o projeto. Quem conhece o Credeq hoje, não só a questão física mas também o projeto técnico, percebe que ele cresceu bastante se comparado com o pensamento dele no início. Se essa construção tivesse ficado pronta muito antes, talvez não tivéssemos o grau de excelência que temos agora.
O Estado pretende construir outras unidades em outros locais, mas a demanda não é muito grande para os poucos leitos disponíveis no Credeq?
Eu tenho uma visão pessoal que é diferente da que a Secretaria tem. Como é um projeto novo, não tem sentido fazer vários. É melhor que se faça um piloto e avalie o fator custo-efetividade, pois pode ser que o projeto seja muito interessante, mas não seja viável. É viável a construção de cinco Credeqs? A crítica que faço ao projeto, desde o início, é essa. É preciso colocar este para funcionar, avaliá-lo e depois decidir se vale a pena ampliar essa estratégia. Não se pode apostar tudo em algo que é novo; no sentido de gasto público, isso é um pouco imprudente. É melhor que se invista e planeje bem uma unidade, ainda que ela não atenda toda a realidade, pois não se pode iniciar algo novo e resolver todo o problema. É necessário ver a eficácia disso não só no tratamento, mas também na rede. O Credeq agora é mais uma engrenagem da rede e isso tem impacto no sistema, algo que pode ser positivo ou negativo. O planejamento é para que seja positivo e que amplie a potencialidade de cada unidade da rede, pois cada uma contempla uma especificidade. O Credeq não tem condição de estar na vila onde o indivíduo mora, mas a atenção básica tem. Por sua vez, a atenção básica não consegue prestar assistência aos casos mais graves, os Caps e o Credeq têm. Esse é o conceito de rede. Não há serviços isolados, mas uma rede prestadora de serviços; o importante é fazer com que não haja buracos nessa rede.
Em relação ao número de leitos, acho difícil afirmar que a quantidade é pequena. É pouco em relação a quê? Ao número de vagas que um hospital psiquiátrico oferece? Quando entendemos que o Credeq foi desenhado para atender aos casos de internação mais graves, sabemos que ele não vai atender todo problema de dependência química; vai atender uma parcela muito específica. É o que a UTI de um hospital faz. Não são todos os pacientes de um hospital que vão precisar de UTI, mas aqueles vão precisar não têm condições de serem assistidos por outro tipo de estrutura. Ainda que consigamos antecipar ou planejar, apenas com o funcionamento seremos capazes de dizer se o número de leitos que este Credeq tem atende à realidade da rede, se atende parcialmente, se supera ou se não atende.
O tratamento de dependência química é muito caro e grande parte desse custo está relacionada à necessidade de uma equipe para prestar assistência. Então, precisa-se de profissionais de nível superior, com qualificação específica. O recurso humano é muito especializado, o que acaba encarecendo o tratamento, que é de internação, isto é, demanda atenção 24 horas por dia. Além disso, o prazo não é curto. Trabalhamos com três meses, mas geralmente o tratamento vai de 30 a seis meses, um ano. A questão é: vale a pena para o Estado arcar com esse custo? Quando se olha o sentido social, de pessoas que já tentaram todos os braços de tratamento e que têm prejuízos graves pessoal e socialmente, entendemos que as pessoas necessitam que o Estado supra esses custos. É semelhante aos casos de pacientes que têm doenças raras ou que precisam de um transplante. Eles custam mais ao Estado que centenas de pacientes, mas a necessidade dele precisa ser atendida.
O Credeq, então, vem para atender ao pensamento de que as drogas deixaram de ser uma questão unicamente policial, sendo um fator de saúde pública e também social.
O fato de as drogas serem ilícitas e o comércio delas ser ilegal, efetivamente torna a questão um problema de segurança pública. A questão é: as pessoas que usam drogas e desenvolvem dependência química precisam de uma abordagem na área da saúde, pois a dependência química é uma doença. Ainda que existam pessoas que usam drogas ocasionalmente e não desenvolvem dependência, há um número grande de pessoas que vão desenvolver. As pessoas que adoeceram pelo uso da droga, elas precisam da atuação da rede de saúde. Então, a questão das drogas é complexa, pois envolve segurança pública, saúde, educação e aspectos do desenvolvimento social.
O Credeq vai atender crianças com dependência química. Como será a parte educacional do tratamento?
Vamos contratar pedagogos para o público infanto-juvenil, especificamente para os menores de 12 anos. Esse trabalho é importante porque são crianças que não tiveram acesso ou tiveram muita dificuldade de desenvolvimento escolar. São crianças que demandam uma abordagem específica. No que diz respeito ao tratamento da criança, todos os profissionais são voltados para essa área: o médico que presta assistência da parte clínica é o pediatra, o psiquiatra é o psiquiatra infantil, os psicólogos têm especialização em infância e adolescência. A assistência prestada não é a mesma da dos adultos, pois são pessoas em fases diferentes do desenvolvimento e isso precisa ser levado em consideração porque influencia na dependência. Na criança, por exemplo, a família ganha um peso muito maior. É muito difícil encontrar um menor de 12 anos com dependência grave de drogas que não tenha uma família muito desestruturada e com um atraso escolar muito significativo. É praticamente impossível. Tudo isso é considerado. A maioria desses menores também tem conflito com a lei. Precisamos resolver isso.
Fala-se muito na liberação de algumas drogas como meio de combate ao problema de drogas no Brasil. Como o sr. enxerga esta questão?
Acredito que deva ter mais atividades de educação para população a fim de que ela entenda a questão dos riscos pelo uso de substâncias. Não tem nenhuma substância que esteja isenta de riscos e qualquer um que alegue isto está sendo ingênuo ou tem má intenção. Não existem substâncias livre de risco. Veja o álcool, por exemplo. Um adolescente que nunca bebeu vai a uma festa e ingere três doses de vodca, fica muito alcoolizado e pode se envolver em um acidente. Então, mesmo que não tenha dependência, que não seja um uso convencional, o álcool está ligado a certos riscos. Esse é o entendimento que a população precisa ter e não apenas saber que tal droga é mais inofensiva que a outra. A questão é trabalhar a realidade dos riscos de cada substância. Quando falamos das drogas psicoativas, vemos que o padrão de consumo do álcool, por exemplo, não é prejudicial.
Então, você tem uma quantidade de bebida alcoólica que não traz prejuízo grave, a curto e longo prazo, ainda que tenha seus riscos. Já quanto a outras substâncias, não existem níveis seguros de consumo. O cigarro, por exemplo. "Um cigarro por mês é seguro", não temos isso. Quem faz o uso dessas substâncias tem que estar consciente dos riscos. É assim com a maconha. Existem muitas pesquisas que mostram o prejuízo, principalmente, com doenças mentais. Além de desenvolver um transtorno mental muito grave, como a esquizofrenia, você pode ter lesões pelo consumo frequente. Da mesma forma é com quem faz uso prolongado de álcool, que pode ter problemas hepáticos, problemas gastrointestinais e demais problemas de saúde desenvolvidos a partir do consumo. O mesmo vale com a maconha; ela pode provocar alterações cognitivas, de memória, de motivação, na fertilidade e ainda está ligada a transtornos mentais – e, em quem já os tem, a maconha agrava o quadro.
A pessoa que tem transtorno tende a recorrer mais facilmente à substância. Existe um fenômeno, que é importante ressaltar, ligado à presença do transtorno mental, que aumenta a chance de consumo de substâncias e, assim, provoca a dependência química. A pessoa busca aliviar algum sintoma que tenha, mas a substância acaba por agravar a patologia. São questões muito complexas relacionadas. Quando se começa a falar delas a uma população muito heterogênea, em um país de tamanho continental, e sem acesso a educação de qualidade, você diz que a liberação das drogas cria um risco muito grande. Todos os elementos que estamos discutindo exigem conhecimento e uma educação a que a maioria não tem acesso. Elas só ficam com a informação básica "ah, maconha não faz mal", "é uma droga mais leve" e que não são precisas. A partir do momento que você libera o uso, você não libera apenas para quem tem condições de avaliar os riscos de usar ou não; você a libera para todos. E quando você libera, como fizemos com o álcool e com o cigarro, você percebe que as drogas mais consumidas são as liberadas.
Então, a melhor maneira de aumentar o consumo é legalizando. Ainda que proibir o uso da substância não resolva o uso do consumo – por exemplo, mesmo se proibir o cigarro, continuará existindo uma demanda de pessoas que fumam e, assim, acaba surgindo um tráfico -, legalizar também não resolve o problema. E quando levamos em consideração todas essas questões, como a realidade continental brasileira, você vê o grande risco da liberação da maconha. Se você legaliza, você amplia o acesso, tem mais pessoas fazendo o uso e, assim, mais pessoas que têm complicações. Inevitavelmente, você terá pessoas mais jovens desenvolvendo transtornos mentais e a saúde pública, hoje, não consegue atender os casos que já existem. Você sobrecarregará uma rede que já é ineficiente. Existe uma série de fatores que levam os médicos psiquiatras a serem contra a legalização. Ainda que intensificando o combate às drogas não vá reduzir o consumo, a descriminalização não parece um caminho adequado à realidade brasileira. Por mais que outros países consigam, o Brasil tem muito mais a perder que ganhar, nesse sentido.
Existe um prazo para que o Credeq funcione em sua capacidade total?
Por mais que exista um planejamento, dependemos da determinação da secretária. Abrimos agora com os 30 leitos, que correspondem a pouco mais que 30% da capacidade total, e têm, ao longo desse ano, as quatro etapas para que se atinja 100% de funcionamento. É claro que o planejamento pode mudar conforme o interesse e a expectativa da secretaria. Não depende apenas do Credeq, mas estamos preparados para isso.
É importante que a população conheça uma unidade nova, para que as pessoas saibam como ter acesso a ela. Como a unidade é regulada, o acesso é por encaminhamento do Caps e, nesse momento, apenas os Caps-AD têm essa referência. Mas, na próxima etapa, queremos ampliar a todos os Caps, que são 76 em todo Estado, e nós queremos atendê-lo completamente. Os pacientes que têm dificuldades com o uso de drogas precisam buscar a Rede de Atenção do município, a Secretaria de Saúde. Aqueles, em cuja região tenha Caps, procure-o, pois ele fará o acompanhamento e os casos mais graves nos serão encaminhados. (03/07/16)
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Múltipla assistência
Um dos grandes diferenciais do Hospital de Urgências Governador Otávio Lage de Siqueira (Hugol), em Goiânia, é a multidisciplinaridade no atendimento, desde a entrada, na Urgência e Emergência, até a assistência durante a internação. São 2102 colaboradores atuando no hospital, dentre estes, 319 médicos.
São diversos profissionais da saúde, como médicos, enfermeiros, nutricionistas, farmacêuticos, psicólogos, assistentes sociais, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, técnicos em enfermagem, técnicos em gesso, cirurgiões buco-maxilo-faciais, além das equipes de diagnóstico por imagem e biomédicos para laboratorial e transfusional e as equipes de suporte (apoio e administrativo), recepção, higienização, processamento de roupas e vigilância.
"Todos esses profissionais são habilitados, capacitados e treinados constantemente para oferecer a assistência no padrão merecido pela população atendida na unidade", ressalta o diretor Geral, Hélio Ponciano. Essa qualidade é atestada pelos pacientes do Hugol: o índice de satisfação se mantém na média de 97%, de janeiro a maio deste ano.
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O HOJE
Reparação da mama ainda demora no SUS
A realização do procedimento esbarra no déficit de centros cirúrgicos e baixa remuneração dos médicos
Karla Araujo
A cirurgia de reconstrução de mama é um direito assegurado a toda mulher pela Lei nº 9.797/1999. O texto determina que “cabe ao Sistema Único de Saúde (SUS), por meio de sua rede de unidades públicas ou conveniadas, prestar serviço de cirurgia plástica reconstrutiva de mama”. A norma foi modificada pela Lei nº 12.802/2013, que impôs a realização da cirurgia imediatamente após a paciente alcançar as condições clínicas requeridas. Ou seja, mesmo que a mulher não possa ter a reconstrução da mama no mesmo momento da retirada do câncer, ela tem direito ao procedimento assim que for liberada pelo médico. A condição também vale para os planos de saúde. No SUS, porém, o desafio ainda é grande.
De acordo com o mastologista do Hospital Araújo Jorge e presidente da Sociedade Brasileira de Mastologia, Ruffo de Freitas Jr., há oito anos, 15% das mulheres conseguiam fazer a cirurgia pelo SUS. Hoje, o número subiu para 30%. Do total de pacientes, outros 30% não podem fazer a reconstrução devido a alguma questão clínica. “A boa notícia é que em poucos anos conseguimos aumentar em 100% a quantidade de procedimentos realizados. A notícia ruim é que ainda temos 40% das mulheres esperando pela cirurgia”, afirma Freitas.
O presidente explica que a realização do procedimento esbarra no déficit de centros cirúrgicos e baixa remuneração dos médicos. Por toda a cirurgia, diz Freitas, o custo para o SUS é de R$ 350. Deste total, os médicos recebem R$ 175. “Diante dos desafios, a prioridade é para retirar tumores. A reconstrução fica em segundo plano. Assim, é preferível fazer duas cirurgias de retirada do câncer em duas mulheres do que dois procedimentos – câncer e reconstrução – na mesma mulher”, explica Freitas.
Desafio
O advogado especialista em Direito Médico e Hospitalar Ricardo Mendonça lembra que a cirurgia não pode ser vista apenas como um fator estético. “É um procedimento totalmente clínico e interfere diretamente no psicológico da mulher”, explica. Para Mendonça, a falta de valorização dos médicos no SUS é o fator que mais prolonga a espera na fila pelo procedimento de reconstrução. “Na rede particular, o médico ganha até três vezes mais que no SUS. Como em toda profissão, existem aqueles que trabalham por ideal e é por causa destes que a fila para este tipo de cirurgia está andando, mesmo que devagar”, afirma Mendonça
Mulheres protagonizam histórias de superação
Cristina Musmanno, 42, é bióloga e foi diagnosticada com câncer de mama em 2006, quando estava grávida da segunda filha. Na época, ela morava no Rio de Janeiro e fez a cirurgia pelo Instituto Nacional de Câncer (Inca), órgão do Ministério da Saúde. Diante da gravidade dos tumores, ela precisou retirar as duas mamas, mas não pôde fazer o procedimento de reconstrução em seguida por causa da gravidez. “Só busquei a cirurgia dois anos depois, mas a fila estava muito grande, não queria esperar tanto. Como minha família já tinha plano de saúde, optei por pedir o encaminhamento do SUS para a rede particular e sair da fila”, explica Cristina.
“Foi um momento muito difícil, mas minha família ficou mais unida depois. Temos muita fé e isso é muito importante. Alguns dias, não tinha forças para rezar, então eu cantava. Se para quem tem fé é difícil, imagino que é muito pior para a pessoa que não acredita em nada”, diz Cristina. Ao contrário da maioria das mulheres, Cristina preferiu não colocar prótese de silicone. A cirurgia de reconstrução foi feita com pele e gordura do abdômen.
Depois de vencer o câncer e dois anos sem o maior símbolo de sua feminilidade, Cristina, o esposo, Luiz Henrique Fernandes Musmanno, 47, e as filhas, Clara, 14, e Luiza, 12, vivem em Goiânia. Em 2009, Cristina passou em um concurso público para trabalhar na Prefeitura de Goiânia. Anos depois ela passou em outro concurso, desta vez, do Inca. “Entrei no Inca como paciente e hoje é o meu trabalho. Fechei um ciclo”, comemora.
Espera
Adelice Borges, 58, descobriu que tinha câncer de mama em 2002, quando fez a cirurgia de retirada do seio e iniciou o tratamento de cinco anos com medicação pelo SUS. Em 2006, ela fez a cirurgia. Adelice levou dois anos para conseguir realizar o procedimento. “Sou uma pessoa muito tranquila e de bem com a vida, tive pouca dificuldade com a doença, se comparado com outras pessoas que conheço. O que dói é o preconceito e a humilhação para conseguir uma medicação no SUS”, lembra. (04/07/16)
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Rosane Rodrigues da Cunha
Assessoria de Comunicação